sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Auto-Avaliação

Um dia cheguei á conclusão de que a minha imaginação ia muito para além do bom gosto, quanto mais do politicamente correcto, no que diz respeito ao humor.

Sendo utente do Metro desde que estou em Lisboa, vi desfilar o catálogo dos cegos que pedem nas carruagens. A primeira vez que vi dois cruzarem-se em sentidos opostos a minha mente processou uma cena de luta tipo "O Tigre e o Dragão" ou o "Matrix"! Lá fiquei a perguntar-me o quanto é saudavel a minha imaginação... Mas efectivamente tenho de me haver com ela. Quando passa um que tem o pregão já bem distorcido pelo uso a dizer "Tenha a bondade de me auxiliar...", mas que soa a "Tenha a bondade de me auzbrtghaar", dou por mim a encaixar palavras naquela última e pensar no resultado pratico. A pior foi possivelmente: Tenha a bondade de me alucinar com a vossa esmola por favor. A imagem de alguem a meter uma moeda no copo e do cego aos gritos e a ter convulsões, enfim, deixa-me com uns certos remorsos...
Ás vezes quase que vivo aquela alegoria de ter um diabinho em cima de um ombro e um anjo no outro. O diabinho faz a piada de péssimo gosto, e eu lá me vou rindo, e o anjinho no outro lado vai-me lembrando que vou ser chamuscado pela eternidade fora!

Outro episódio com um cego no metro deixou-me a pensar no estado das coisas.
Um cego com muito má fama, ou seja, de agarrado, de não ser bem cego, de ser bruto e malcriado, e tantas coisas mais, ia a passar e tropeçou na caixa da minha guitarra. Culpa minha, estava distraido e não reparei que ele tinha entrado ao mesmo tempo que eu na carruagem. Não caiu mas esteve quase, e desatou a dizer palavrões, como deve fazer tantas outras vezes ao longo do dia. Instintivamente pus-lhe a mão no ombro e disse com toda a sinceridade do mundo:
-Peço-lhe imensa desculpa! Esta distraido e e não o vi. Desculpe!
A expressão dele foi de algum espanto. Virou-se, pôs-me a mão no ombro também e disse:
-Não, eu é que lhe peço desculpa, pela falta de educação. Desculpe!
Cheguei á conclusão de que aquele simples gesto, em que alguém lhe mete a mão no ombro e lhe pede desculpa, deve ser coisa rara no seu dia-a-dia. A rotina deve ser mais o encalhar, dizer palavrões, e ganhar má fama. Deve ser muito dificil tratar bem um mundo que nos maltrata. Não nascemos todos para ser Ghandi, isso é de certeza.

Tiro alguma moral de tudo isto, obviamente. Não me sinto mal por o meu humor ser tão ruim, porque realmente, no fim-de-contas, o que importa mesmo é outra história.

P.S. Rita, apesar de estar moribundo e por isso pouco "apresentável", como tu sublinhaste à bocado, vim cá deixar este postzinho. Não quero que te sintas sozinha aqui no nosso canto! ;-)

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