domingo, 27 de abril de 2008

Abril e as gerações

Há uns anos um amigo meu contou-me uma piada que fez à mesa no dia 25 de Abril e que é um bom espelho da maneira como as diferentes gerações sentem o 25 de Abril.

Acabado de acordar depois de uma noitada em véspera de feriado, o meu amigo Gonçalo vai directo para a mesa de almoço onde está a familia reunida. No meio de uma conversa animada alguem relembra que não podem ir a certo sitio comprar o que precisam, porque sendo feriado provavelmente está fechado. Ele farto de saber que dia era, aproveita-se do facto de regra geral não saber mesmo a quantas anda no calendário e pergunta:

- Que dia é hoje mesmo?

De súbito abate-se o silêncio sobre a mesa, apenas etrecortado pelo engasgo que a pergunta causou à sua Tia. Até que chegam os esperados:

- Parece mentira!
- Como é que tu não sabes que dia é hoje?!?

E o Pai dele se chega à frente com o discuso:

- Este foi um dos dias mais felizes da minha vida. É o dia mais bonito da nossa história, etc...

Foi à mesa do Gonçalo mas podia perfeitamente ter sido na minha, ou na de tantos outros da nossa geração cujos pais sofreram as vicissitudes do antigo regime. Mas o facto é que nos é dificil ser militantes eufóricos de algo que não vivemos. Para nós, mesmo estando o mundo que conhecemos longe de ser perfeito, a liberdade é um dado adquirido. Não conhecemos a outra realidade, e como tal, apesar de longe de ser indiferentes (pelo menos a maior parte), não sentimos as comemorações da revolução com a intensidade que elas mereciam.

O meu amigo Júlio Resende tem um tema excelente que se chama "Filhos da Revolução"(No CD - "Da Alma", Cleen Feed 2007) , que mistura brilhantemente reminiscências da sonoridade das canções de intervenção com a linguagem jazzistica. No fundo o titulo é o que todos somos: Filhos da Revolução. Filhos ingratos talvez, de vistas curtas para perceber completamente a diferença que a nossa vida faria caso a História tivesse sido diferente, mas somos a expressão dessa liberdade conquistada.

Só espero que não se chege à cegueira, apesar do Salazar ter ganho uma palhaçada de concurso no ano passado. Espero que não se passe da miopia. Que se continue a dizer "Fascismo nunca mais", ainda que não aos gritos, porque é injusto que nos peçam tanto sentir quando pertencemos a outra era. Mas que quando morrerem os que ainda gritam os outros respeitem o que eles passaram e mantenham a dignidade de nunca mais pemitirem que nos tirem a liberdade. Nunca mais. Porque na liberdade está grande parte da dignidade humana.

1 comentário:

Ana disse...

Neste tema torno-me fundamentalista/militante eufórica. Revejo-me na data e nos ideais e continuo a achar q mt falta cumprir. Se nos focarmos na liberdade de expressão,ainda temos alguma dignidade, se passarmos à liberdade de acesso à saúde, à educação, ao trabalho e por ai fora, concluimos que Abril n pertence apenas à geração q o fez e tem q continuar em marcha. N vivemos num mundo perfeito, mas ele é o espelho daquilo q vamos fazendo ou n, e até agora a indiferença só se tem traduzido em maiores desigualdades.